sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

ADRIANO DE PAIVA


                                                                O legitimo pai da televisão

                                       
                                                                    Retrato de Adriano de Paiva 1847 - 1907  (arq. da FCUP)



Desde tempos remotos, o Homem teve necessidade de transmitir à distância informações sobre tudo o que o rodeava. A ideia da transmissão à distância de imagens remonta aos finais do século XIX, através da acção de alguns "visionários" em todo o mundo, os quais recorreram aos meios que a tecnologia à data lhes proporcionava, ou, então, enveredaram pelo campo da imaginação baseada em determinados pressupostos, os quais, anos mais tarde vieram dar ou retirar razão a quem os formulava. Escritores e ilustradores da época, imaginavam transcrevendo para ilustrações publicadas, essa ideia da magia da transmissão de imagens à distância. À época foi como que uma ficção cientifica…

 
 
 
 
 
 
 
 
 
                                   Ilustrações visionárias alusivas ao sonho da televisão em meados do séc. XIX
                                                                                                             (col. pess.)
 



No entanto, em termos de televisão, tudo começou com o cientista português Adriano de Paiva de Faria Leite Brandão, nascido em São Tiago da Cividade, Braga, a 22 de abril de 1847. Estudou Matemática em Coimbra como Bacharel, tendo obtido o grau de Doutor em Filosofia no ano de 1868. Foi autor de "These Ex Naturali Philosophia" (1868). Nomeado lente substituto temporário por 2 anos, da secção da 7.ª, 8.ª e 9.ª cadeira, pelo decreto de 14 de janeiro e carta régia de 6 de março de 1873, leccionando Química e mais tarde Física. Já em março de 1878, este professor de Física da Academia Politécnica do Porto, publicou um tratado dos princípios fundamentais da termodinâmica. O Dr. Adriano de Paiva Brandão, ficou conhecido nos meios científicos pelas suas reflexões sobre a telescopia, como uma nova aplicação da electricidade e publicou na revista "O Instituto", de Coimbra, um artigo onde divulgava o recurso ao elemento selénio como meio de transdução da luz em corrente eléctrica, aproveitando as suas características fotocondutoras, a partir do qual seria possível a transmissão à distância de imagens em movimento, tendo-lhe dado a designação de "A Telescopia Eléctrica Baseada no Emprego do Selénio". Não chegou a efectuar os testes que a comprovariam, limitando-se a publicar apenas um estudo teórico a esse respeito na revista. Esta ideia surgiu-lhe graças às notícias, entretanto chegadas a Portugal pelo jornal "O Século de Coimbra", em o nº 2 da 2ª série, correspondente a dezembro de 1876, sobre a invenção do telefone pelo americano Graham Bell (1847 - 1922), e mais tarde com a primeira demonstração do telefone em Lisboa, em novembro de 1877. Adriano de Paiva interrogava-se, que se a transmissão da voz à distância era uma realidade, porque não a transmissão da imagem de quem falava?! Idealizou também sobre as possibilidades de produzir um sistema equivalente ao de Graham Bell para a transmissão de imagens animadas. O termo telescópio designava já um processo de comunicação óptica. A originalidade do contributo de Adriano de Paiva consistia em utilizar o selénio como placa sensível do campo negro do teletroscópio. O selénio fora descoberto em 1817 por Jöns Jacob Berzelius (1779 - 1848), e as suas propriedades estudadas desde 1873 por Willoughby Smith (1828 - 1891), com a ajuda de L. May. Adriano de Paiva referia-se também aos trabalhos conduzidos pelos irmãos Siemens em 1875 e 1876.


                                            Lentes da Academia Politécnica do Porto de 1880/81, onde se encontra Adriano de Paiva,
                                                              o segundo em pé da direita para a esquerda (foto do arq. da FCUP)



                                                                              Edifício da Academia Politécnica do Porto em 1880
                                                                           (arq. da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto)


 
                                                       Laboratórios de Física e Química da Academia Politécnica do Porto em 1880
                                                                                                            (arq. da FCUP)
                                               
                                                                                                              

                                                                         Esquema da teoria de Adriano de Paiva (arq. da FCUP)



                                                                              Publicação da teria de Adriano de Paiva em 1880 
                                                                                                           (arq. da FCUP)

 



Escreveu Adriano de Paiva nesse seu artigo: "Desde que as considerações precedentes se desenharam claras ao nosso espírito, para logo nos quis parecer que uma nova descoberta científica se anunciava para breve; seria a aplicação da electricidade à telescopia, ou a criação da telescopia eléctrica. (...) Uma câmara escura, colocada no ponto que houvesse de ser sujeito às observações, representaria, por assim dizer, a câmara ocular. Sobre uma placa, situada no fundo dessa câmara iria desenhar-se a imagem dos objectos exteriores, com as suas cores respectivas e acidentes particulares de iluminação, afectando assim diversamente as diversas regiões da placa. Tornava-se por tanto apenas necessário descobrir o meio de operar a transformação por nenhuma forma impossível, desta energia, absorvida pela placa, em correntes eléctricas, que em seguida recompuzessem a imagem. A importância da descoberta dum instrumento de tal ordem manifesta-se com demasiada evidência. Contudo não é talvez inútil advertir que esse telescópio eléctrico, quando realizado preencheria uma lacuna que a telescopia actual, a despeito de todos os seus progressos jamais poderia pensar em fazer desaparecer. (...) Com o novo telescópio, (...) transformado em corrente eléctrica, o movimento luminoso percorreria docilmente o caminho que nos aprouvesse dar ao fio destinado a conduzi-lo; e de um ponto do globo terrestre seria possível devassar este em toda a sua extensão". 
Entretanto, foi nomeado sócio correspondente da Academia de Ciências de Lisboa (1881), sócio do Instituto de Coimbra, sócio fundador e perpétuo da "Societé dês Electriciens" de Paris, tendo sido nomeado Presidente desta Sociedade em Portugal. Graças aos méritos científicos então reconhecidos por toda a comunidade científica, o rei D. Luiz I fê-lo Conde de Campo Belo e par do Reino, faleceu em Vila Nova de Gaia em 1907 com 60 anos de idade.
 
   
                                               Diagrama da câmara de selénio, de George R.Carey em1880,
                                                                               baseado na teoria de Adriano de Paiva (arq. priv.)
 
 
 
 
 
O artigo de Adriano de Paiva, então publicado, é ainda hoje considerado por alguns meios científicos internacionais como o precursor da televisão no Mundo, face ao envolvimento técnico nele preconizado, o qual é nos dias que correm, apesar dos avanços entretanto alcançados, o suporte base dos transdutores luz/corrente eléctrica empregues, como acontece com os sensores CCD (Coupled Charge Device) e os C-MOS (Complementary Metal Oxide Semiconductor), que é o mesmo, ou seja a fotocondutividade. Este importante trabalho do cientista português, Adriano de Paiva, teve um impacto internacional e inspirou estudos pioneiros no campo da televisão desde então, até à actualidade (tema a desenvolver em próximo artigo).
Por curiosidade este artigo de Adriano de Paiva, foi lido e estudado durante os anos 20 em Itália, quando o regime de Benito Mussolini (1883 - 1945), se interessou pelo tema televisivo. Com os desenvolvimentos verificados na década de 20, do século passado, em especial graças à acção do escocês John Logie Baird (1888 - 1946), com o seu sistema de televisão mecânica baseada no disco Paul Gottlieb Nipkow (1860 - 1940), o nome de Adriano de Paiva deixou de ser referenciado como o mentor de uma tecnologia que lhe ficou a dever imenso. Esta situação manteve-se até 1967 quando em Lisboa, na Universidade Técnica, o ideólogo alemão do sistema de televisão a cores PAL, o engenheiro Walter Bruch (1908 - 1990), proferiu uma palestra sobre o seu invento, contudo não se esqueceu de lembrar aos presentes que foi o português Adriano de Paiva quem deu origem ao que ali veio apresentar, recuperando, assim, em termos internacionais, o mérito que lhe é devido. Podendo por isso Portugal ter certo orgulho em também haver contribuído para o nascimento da técnica televisiva e considerar-se Adriano de Paiva o legitimo pai da televisão.

 
Receptor de televisão dos anos 50 (arq. pess.)
                                          




                                                        

                                                                                    Receptor de televisão actual (foto do fabricante)
                                                                                                                                



                                                                                                                                                        
                                                                              

Texto:
Paulo Nogueira


Fontes e bibliografia: 
VARELLA, Manuel, Portugal nas origens históricas da Televisão: Notícia sobre Adriano de Paiva, autor dos primeiros ensaios escritos da transmissão de imagens à distância em 1877, Edição da Casa do Pessoal da Radiotelevisão Portuguesa, Lisboa, 1981
ALVES, Jorge Fernandes da (FLUP) in publicação on line
O Instituto. Revista scientifica e literária. XXIV Março de 1878 - Segunda série nº 9  Coimbra. Imprensa da Universidade

 

Sem comentários:

Enviar um comentário